Se algum dia me vir chorando

Hoje eu trouxe um texto que me cativou desde o início e a cada palavra mais me envolvia e emocionava, me fazia refletir… Por isso solicitei uma autorização aos Doutores da Alegria para compartilhá-lo com vocês e espero que vocês também se encantem, se toquem e acima de tudo reflitam!

 

É o relato de uma visita do meu querido e admirado Luciano Pontes, ou melhor, Dr. Lui a um hospital aqui de Recife, mas serve para refletirmos muito além das paredes das enfermarias.

 

Quantas vezes desistimos de pessoas, de situações e até de nós mesmos por tão pouco? Muitas vezes um simples gesto de carinho e atenção, a sensibilidade de saber o que aquela pessoa precisa naquele momento, mesmo que ela esteja dizendo ou demonstrando o contrário…

 

Quantas vezes você, por causa do estresse do dia a dia, descarregou todos os seus problemas em cima de alguém muito querido e que não tinha culpa de nada? Quantas vezes seu filho chegou e saiu sem que você entendesse o que ele queria?? Para muitas pessoas, independente da idade, é difícil expressar seus sentimentos, então vamos ter mais sensibilidade e prestar mais atenção às mensagens do nosso coração?! Vamos nos permitir abraçar mais, ouvir mais, amar mais…

 

“Nem sempre os besteirologistas são queridos à primeira visita.

 

É preciso, muitas vezes, o tempo da conquista até que os laços de estabeleçam. E esse é o caminho que leva e eleva os encontros aos momentos felizes dentro de um hospital. E como nem tudo é fácil, é preciso persistir e achar, ao menos, uma brecha no meio de um choro imbuído de medo, manha ou outro sentimento de vulnerabilidade de uma criança, por exemplo, para a transformação crescer.

 

Naquele dia, a pequena D. chorou bem depois de termos tido a permissão para entrar na enfermaria e de ter nos olhado três vezes. A sua mãe, fonte e porto seguro, não estava ao seu lado e isso agravou a reação. Enquanto ela chorava, as outras crianças esperavam, ávidas, a vez de a brincadeira acontecer com elas. É sempre comum, ao vermos uma reação de choro de uma criança, acreditarmos que não é conveniente nossa presença e partirmos. Nessas situações me pego pensando que sair, desistir, é o caminho mais fácil e previsível.

Às vezes, claro que não dá para seguir, noutras tem sempre uma chance. E talvez eu acredite sempre na outra chance. É que o meu desejo por dentro e fora da máscara que uso é de ir além, de mudar, de conseguir conectar e estabelecer um canal de comunicação sem desistir tão fácil do encontro só porque tem choro. Isso é um desafio, um risco, um abismo cheio de possibilidades.

 

E foi sem medo de partir o fio, e percebendo que aquele choro era porque ela acreditava que por trás daquela máscara não havia um ser gente, um humano chorão feito ela, que decidi ir além. Enquanto a razão pedia para sair, ir embora, a emoção pedia que arriscasse atravessar o limiar. Assim foi que, ao lado de sua mãe, retiramos o nariz vermelho de palhaço que somos e revelamos o “nosso segredo”. E eis que a fonte secou e o olho brilhou, mas sem rir.

 

Ela se viu no espelho dos nossos olhos e reconheceu uma criança, mais adulta que ela, e que sabia e queria brincar.

E assim saímos, sem mais som nenhum de choro, apenas um olhar silencioso e curioso acompanhando nossas ações e brincadeiras com as outras crianças da enfermaria. Se fôssemos embora, desistido dela, o choro não seria alento do desconhecido. Ao menos agora, ela saberá que o mistério está além do que se quer ver e o que se vê é real como ela é.

 

E se algum dia me vir chorando, não vá embora e nem desista de mim.”

 

Dr. Lui (Luciano Pontes)
Hospital Barão de Lucena – Recife

 

Para finalizar coloquei esta música que  para mim é uma poesia, “e quando eu estiver triste, simplesmente me abrace…” Simplesmente de Nando Reis e Samuel Rosas.